terça-feira, 19 de abril de 2011

Para que serve a física?

Para que serve a física?


H. Moysés Nussenzveig,

Professor Emérito do Instituto de Física da UFRJ.



A ciência desempenha um papel muito importante no mundo contemporâneo. Não era assim há poucas gerações atrás: o desenvolvimento científico tem-se acelerado enormemente. Tornou-se lugar comum dizer-se que vivemos numa sociedade tecnológica e medir o progresso pelo grau de desenvolvimento tecnológico. A tecnologia depende crucialmente da ciência para renovar-se, e também contribui para ela, mas não devem ser confundidas.

Sem dúvida, nossas vidas são profundamente afetadas pela tecnologia, e de forma que muitas vezes está longe de ser benéfica. Basta lembrar os problemas da poluição e do aquecimento global. Os cientistas são freqüentemente responsabilizados pelos aspectos negativos decorrentes de suas descobertas, embora o uso que delas se faz dependa de fatores políticos e econômicos alheios a sua vontade. Por mais benéfica que seja a intenção original, ela é freqüentemente deturpada. Por isto mesmo, os cientistas devem ter consciência de sua responsabilidade.

Vários problemas cruciais de nossa época dependem para sua solução de avanços científicos e tecnológicos, inclusive aqueles que se originam direta ou indiretamente desses avanços. Os problemas da energia e do meio ambiente adquiriram importância vital.

A reação anticientífica existiu desde os primórdios da historia da física. Basta lembrar o exemplo de Galileu. Goethe atacou Newton por sua teoria das cores, dizendo que a essência das cores se percebe num por de sol, e não fazendo experiências com um prisma. É preciso reconhecer que a visão científica do mundo não exclui nem invalida outras variedades da experiência. Podemos aplicar a acústica, a neurofisiologia e a psicologia ao estudo das sensações provocadas pela audição de uma sonata de Mozart, mas ainda estaríamos omitindo provavelmente o aspecto mais importante.

A consciência das limitações do método científico não nos deve impedir de apreciar sua imensa contribuição ao conhecimento da natureza. A motivação básica da ciência sempre tem sido a de entender o mundo. É a mesma curiosidade que leva um menino a desmontar um relógio para saber como funciona. De que são feitas as coisas? Como e por que se movem os corpos celestes? Qual é a natureza da eletricidade e do magnetismo? O que é a luz? Qual a origem do universo? Estas são algumas das grandes questões que têm sido abordadas pelos físicos.

A experiência tem demonstrado que o trabalho de pesquisa básica, motivado exclusi­vamente pela curiosidade, leva com freqüência a aplicações inesperadas de grande importância prática. O grande experimentador Michael Faraday, logo após uma conferência em que havia explicado seu recente descobrimento do fenômeno da indução eletromagnética, foi questionado por alguém da audiência, que queria saber para que servia o efeito. "Para que serve um bebê recém-nascido?" - foi a resposta. Quase todas as aplicações que fazemos hoje em dia da energia elétrica decorrem do efeito descoberto por Faraday. O transistor, o laser, os compu­tadores resultaram de pesquisas básicas em física.
O trabalho de muitas gerações demonstrou a existência de ordem e regularidade nos fenômenos naturais, daquilo que chamamos de leis da Natureza. O estudo que ora iniciamos pode ser empreendido pelos mais diversos motivos, mas uma de suas maiores recompensas é uma melhor apreciação da simplicidade, beleza e harmonia dessas leis. É uma espécie de milagre, como disse Einstein: "O que a natureza tem de mais incompreensível é o fato de ser compreensível."

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